Todavia, há situações em que o fornecedor do qual foi
adquirida a mercadoria, após a transação realizada, vem a ser declarado
inidôneo pelo Fisco, o que, consequentemente, torna os créditos aproveitados
pelo contribuinte também inidôneos.
Nesse momento o contribuinte se depara com autuações pelo
Fisco, em razão do aproveitamento de crédito do ICMS decorrente da operação
realizada com o fornecedor e declarado inidôneo após a transação, sendo contra
ele lavrado auto de infração e a aplicação de multa em até 150% do valor do
crédito aproveitado.
No entanto, o problema para o contribuinte não se limita à
esfera administrativa, podendo ser também investigado e processado na esfera
penal. Isto porque a utilização de notas fiscais inidôneas, com o intuito de se
beneficiar de crédito de ICMS, configura crime previsto no artigo 1º, IV, da
Lei 8.137/90, que trata dos Crimes Contra a Ordem Tributária.
É que em decorrência da declaração de inidoneidade do
fornecedor, que à época da transação era considerado idôneo, o contribuinte que
se aproveitou do crédito de ICMS na operação poderá ter contra si instaurada
uma investigação criminal, consistente em apurar sua responsabilidade por crime
contra a ordem tributária.
No entanto, apesar da responsabilidade do contribuinte ser
objetiva na esfera administrativa, bastando o simples fato de o procedimento
administrativo concluir pela inidoneidade das notas para a cobrança do tributo
e sua inscrição em dívida ativa, o mesmo não pode ocorrer na esfera penal, onde
para a configuração de crime contra a ordem tributária é exigido o dolo do
agente contribuinte. E o dolo nada mais é que a intenção livre e consciente do
agente em se apropriar indevidamente do crédito do imposto, por meio de um ato
fraudulento.
Todavia, o aproveitamento de créditos do ICMS oriundos de
fornecedor idôneo à época dos fatos, que veio a ser considerado inidôneo pelo
Fisco, em determinadas situações não pode ser considerado crime, se não existiu
o dolo do agente e restou configurada sua boa-fé.
Havendo a aquisição de produto e estando devidamente
comprovada a realização da transação, através da operação bancária ocorrida
entre comprador e vendedor, bem como a consulta ao Sintegra, para verificar a
situação do fornecedor, não há que se falar em intenção do agente em sonegar
impostos, uma vez que este agiu de boa-fé quando a empresa fornecedora era,
repita-se, à época dos fatos, idônea. E, uma vez reconhecida a boa-fé do
contribuinte, não há que se falar em dolo, requisito exigido como figura típica
do crime tributário.
Tal entendimento já foi pacificado pelo Superior Tribunal de
Justiça (STJ1), ao considerar que o direito do crédito deve ser
reconhecido quando comprovada a boa-fé do contribuinte, entendimento
recentemente acatado pelo Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo
(TIT).
Portanto, uma vez que a empresa da qual foram adquiridas as
mercadorias existiu e operou regularmente por determinado período de tempo –
tendo inscrição estadual e estando listada no Sintegra, comprovadas as
transações existentes entre as partes por meio de documentos hábeis e que,
somente após a operação realizada foi declarada sua inidoneidade, - não se pode
presumir que o contribuinte tenha agido com dolo, cometendo qualquer ilícito
penal.
O contribuinte deve, portanto, se precaver e arquivar toda a
documentação da transação realizada (notas fiscais, contrato social do
fornecedor, transações bancárias, dados de cadastro, entre outros),
demonstrando que o fornecedor estava em situação regular à época dos fatos e
que a operação efetivamente ocorreu.
Restando comprovada a regularidade da operação, ficará
demonstrada a boa-fé do contribuinte, não havendo assim que se falar em prática
de crime contra a ordem tributária.
_________
1 1ª Seção do Superior Tribunal de
Justiça De acordo com a jurisprudência do STJ, "o comerciante de boa-fé
que adquire mercadoria, cuja nota fiscal (emitida pela empresa vendedora)
posteriormente seja declarada inidônea, pode engendrar o aproveitamento do crédito
do ICMS pelo princípio da não-cumulatividade, uma vez demonstrada a veracidade
da compra e venda efetuada, porquanto o ato declaratório da inidoneidade
somente produz efeitos a partir de sua publicação" (REsp 1.148.444/MG,
Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 27/4/2010, submetido ao rito do art.
543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008).
___________
* Adilson A. Pinto é dvogado, sócio responsável pela área de
Direito Penal Empresarial do escritório Ronaldo Martins & Advogado -adilson.pinto@ronaldomartins.adv.br
Fonte- Migalhas 26/10/2012
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