A
corrupção tem propiciado um intenso debate da sociedade e da imprensa a
respeito do desvio de conduta existente nas relações institucionais e privadas
da administração pública do país. O julgamento do mensalão e as eleições
municipais estão catalisando a difusão desse tema.
Essa
realidade também esteve no centro da discussão quando da apuração de outros
escândalos, como o caso da fraude ao INSS capitaneado pela Jorgina de Freitas;
o processo de impeachment do ex-presidente Collor, decorrente da acusação de
fraudes na reforma da casa da dinda e desvio de dinheiro de campanha; a fraude
na construção do TRT de São Paulo, que culminou na cassação do senador Luiz Estevão,
conhecido, também, como “caso Lalau”, entre tanto outros.
Em cada
acontecimento dessa natureza devemos extrair dos fatos maneiras de coibir as
condutas irregulares, evitando, assim, o desvio das verbas públicas.
A
corrupção, entretanto, não é o maior problema relacionado ao desvio de conduta,
precipuamente se comparado com os dados relativos à sonegação. Segundo estudos
da Fiesp o custo médio anual da corrupção no Brasil pode ser calculado entre R$
41,5 bilhões a R$ 69,1 bilhões, representando aproximadamente de 1,5% a 2,6 %
do PIB.[1] A sonegação, de outro lado, segundo estudos do IBPT, determina a
evasão de R$ 200 bilhões, cujos dados levam em conta apenas as pessoas
jurídicas, destacando, ainda, que o faturamento anual não declarado por essas
empresas chega a R$ 1,32 trilhão.[2]
Os
dados deixam claro que a sonegação é uma corrupção qualificada, resultando,
respectivamente, no desvio ou não ingresso de receitas aos cofres públicos.
Natural
que para o alcance dos objetivos e atividades a serem exercidas pelo Estado
será necessária a arrecadação de recursos, a qual não se esgota em si mesma,
sendo um instrumento para a concretização daqueles. Portanto, ambas as
práticas, corrupção e sonegação, acabam por comprometer as políticas públicas a
serem executadas pelo Estado.
Logo, é
fundamental que o Estado adote medidas para evitar esses desvios. Considerando
a maior repercussão econômica da sonegação, e a brevidade da análise, passa-se
a analisar a sonegação em consonância com os deveres institucionais do Estado
para promover seu controle.
A
sonegação acaba afetando a isonomia e provocando graves desigualdades sociais,
assim, para enfrentarmos esses problemas e construirmos um país mais
igualitário, diminuindo a desigualdade social existente, é primordial que todos
contribuam, respeitando, evidentemente, a capacidade contributiva. Entretanto,
sempre haverá aqueles que deixam de cumprir com suas obrigações
espontaneamente.
Dessa
forma, é importante que o Estado seja dotado de órgãos de arrecadação bem estruturados
para exercer esse controle. Nesse pormenor, o Ordenamento Jurídico Brasileiro
incumbiu à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) a arrecadação dos
tributos e demais receitas, não pagas e inscritas em dívida ativa da União.
A
cobrança dos créditos inscritos em dívida ativa da União garantirá a isonomia
entre o devedor e o cidadão que paga seus tributos, evitando, também, a
concorrência desleal e todas as suas consequências nefastas, como o desemprego.
Um
órgão de recuperação bem aparelhado propiciará evitar a sonegação, garantindo,
consequentemente, maior disponibilidade de caixa para a execução das políticas
públicas.
Todavia,
essa lógica está distante da realidade do órgão, o qual carece de uma carreira
efetiva de apoio, estrutura física, técnica e instrumental adequada para o
exercício das atividades dos procuradores da Fazenda Nacional, falta de
provimento de todo o quadro efetivo de procuradores, sistemas informatizados
não integrados, entre outros problemas.
Face a
precariedade de recursos, surpreendentemente, o órgão tem apresentado
resultados relevantes, resultado da atuação dedicada dos seus procuradores e da
criatividade na utilização dos recursos que lhe são destinados.
Levando
em conta apenas os dados relativos ao ano de 2011 a PGFN evitou a perda de R$
277.562.496.807,83(duzentos e setenta e sete bilhões, quinhentos e sessenta e
dois milhões, quatrocentos e noventa e seis mil oitocentos e sete reais e
oitenta e três centavos) para os cofres da União e arrecadou o montante de R$
25.482.287.233,73 (vinte e cinco bilhões, quatrocentos e oitenta e dois
milhões, duzentos e oitenta e sete mil duzentos e trinta e três reais e setenta
e três centavos), ao erário federal.[3]
Considerando-se
o valor total arrecadado e a despesa realizada pela PGFN em 2011, temos que,
para cada R$ 1 (um real) alocado neste órgão, suas atividades retornaram à
sociedade e ao Estado, aproximadamente, R$ 53,93 (cinquenta e três reais e
noventa e três centavos). Se acrescermos ao total arrecadado os valores das
vitórias judiciais e extrajudiciais da PGFN, que refletem a manutenção do caixa
da União, teremos um retorno de R$ 642,52(seiscentos e quarenta e dois reais e
cinquenta e dois centavos) para cada R$ 1 (um real) de despesa.[4]
Pode-se
somar aos dados aqui apresentados o alto índice de vitórias da PGFN nas causas
em que há contestação, aqui tomado em sentido lato, chegando a 88% das ações,
comprovando a alta especialização e dedicação dos procuradores da Fazenda
Nacional.[5]
Relevante
também registrar que a carga de trabalho e condições impostas aos integrantes
da PGFN são bem inferiores àquelas existentes no Poder Judiciário, paradigma em
relação aos órgãos/instituições envolvidas com a prestação jurisdicional, o
qual conta com cerca de 19 servidores para auxiliar o trabalho de cada juiz
federal, enquanto os procuradores da Fazenda Nacional não possuem nem 1
servidor para apoiar as suas atividades. Isso sem registrar que cada procurador
da Fazenda Nacional é responsável por uma média de 7.000 processos judiciais,
carga 30% maior que a dos Magistrados Federais, sem contar as inúmeras
atividades administrativas atinentes aos procuradores da Fazenda Nacional.[6]
Esses
números demonstram que a realidade existente na PGFN não é condizente com a condição
estratégica do órgão, bem como o fato de que a União não tem combatido a
sonegação de forma efetiva.
Nesse
pormenor, temos que a preservação da função estratégica da atividade de
fiscalização e arrecadação da União é garantida desde a criação do Fundo
Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização
(Fundaf) através do Decreto-Lei 1.437/75, o qual tem como escopo financiar o
reaparelhamento e reequipamento das atividades de fiscalização e arrecadação da
União, conforme preconiza o artigo 6° da legislação citada.
Todavia,
a União, a despeito do que determina a Lei 7.711/88, a qual vincula as receitas
do fundo, na subconta da PGFN, para reestruturação do órgão, tem contingenciado
esses valores para os fins mais diversos possíveis, entre eles a realização do
superávit primário.[7]
A falta
de respeito à lei e à eliminação dos problemas enfrentados pelo órgão
demonstram que a sonegação não é o principal objetivo de combate por parte do
governo. Para o bem de nosso Estado Democrático de Direito, da eficiência
administrativa, da estruturação do planejamento estratégico do Estado, do
combate à sonegação e à concorrência desleal é essencial que essa realidade
mude.
[1]
Disponível em: <http://www.fiesp.com.br/competitividade/downloads/custo%20economico%20da%20corrupcao%20-%20final.pdf>
Acesso em 23.10.2012.
[2]Disponível
em: <http://www.ibpt.com.br/img/_publicacao/13649/175.pdf> Acesso em
23.10.2012.
[3]
Disponível em: <
http://www.pgfn.gov.br/noticias/PGFN%20Em%20Numeros%20-%202011.pdf> Acesso
em 23.10.2012.
[4]
Ibid.
[5]
Disponível em:
<http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=12782&Itemid=6>
Acesso em 23.10.2012.
[6]
GADELHA, Marco Antônio. Os Números da PGFN. 2. ed. Sinprofaz. Brasília: 2011.
Disponível em:
<http://www.sinprofaz.org.br/publicacao.php?id=110927181741-1a3209da4c42460ab1808cb468ad34f6&arquivo=/s/images/stories/pdfs/numeros_pgfn_2011.pdf&titpub=Os%20N%C3%BAmeros%20da%20PGFN%20-%202011&>
Acesso em 23.10.2012.
[7]
NUNES, Allan Titonelli. NETO, Heráclio Mendes de Camargo. País deve aplicar
receita da PGFN no próprio órgão. Revista Eletrônica Consultor Jurídico. 23 de
agosto de 2011. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2011-ago-23/pais-investir-receita-pgfn-proprio-orgao>
Acesso em 23.10.2012.
Allan
Titonelli Nunes - Procurador da Fazenda Nacional e presidente do Sindicato
Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz).
Fonte:
Revista Consultor Jurídico, 25 de outubro de 2012
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