O Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (Cedes)
lançou um estudo inédito a respeito das “Restrições Verticais na Defesa da
Concorrência” no Brasil. Foram avaliados cerca de 115 casos sobre três
condutas: acordos de exclusividade, descontos condicionados e venda casada,
sendo 80 casos de exclusividade, pouquíssimos casos de descontos condicionados (que não chegaram
a 10) e cerca de 30 casos de venda casada julgados nesse período. A pesquisa
usou como base casos de 2000 até 2012 utilizando o período inicial da Lei
8.884/1984. O estudo foi apresentado em Brasília, durante Seminário Científico
sobre Direito Concorrencial, que reuniu especialistas nacionais e estrangeiros.
“Isso mostra o reflexo do que foi prioridade das
autoridades, que foi o combate aos cartéis” ressaltou Caio Mário da Silva
Pereira Neto, professor de Direito Econômico da Fundação Getúlio Vargas, que
fez a apresentação do estudo. “O mais importante é saber qual é a metodologia
de análise que o Cade e as autoridades brasileiras estão usando para separar as
restrições verticais consideradas anticompetitivas e as não anticompetitivas”,
explicou.
O estudo identificou que as autoridades adotam geralmente
uma abordagem baseada na análise de efeitos das condutas verticais sobre a
competição. No entanto, foi identificado que há uma oscilação muito
significativa no padrão de provas utilizado e na forma como esta análise se dá
caso a caso. Isso levou a uma certa inconsistência na jurisprudência do Cade
sobre o assunto na última década.
O professor Caio Mário Pereira Neto explicou que a questão
está na forma de avaliação do fechamento do mercado, que, muitas vezes é feito
de forma vaga, sem muitos detalhes. “Existem vários casos em que as autoridades
brasileiras não avaliaram se o nível de fechamento de mercado é substancial. A
jurisprudência americana cita que o fechamento de mercado abaixo de 40% é
considerado, em geral, lícito”.
O professor de Direito Concorrencial e Econômico da
Universidade de Tiburg (Holanda), Damien Geradin, destacou a evolução do
pensamento econômico com relação às restrições verticais. Ele lembrou que na
primeira parte do século XX os economistas presumiram que em uma venda casada
de dois produtos, o fornecedor dominante poderia lucrar com dois monopólios, em
vez de apenas um, levando a sua consideração como conduta ilegal. Geradin
destacou, ainda, como o pensamento econômico sobre restrições verticais evoluiu
nas últimas décadas e atualmente traz uma percepção muito mais balanceada dos
efeitos pró e anticompetitivos, admitindo que a venda casada pode ser eficiente
em diversas situações.
O estudo aponta, ainda, que no caso dos descontos
condicionados, estes são similares a condições de exclusividade mais leves, em
que a empresa tem a alternativa de comprar também de outro fornecedor. Apesar
de existirem muitas definições de descontos condicionados, o estudo do CEDES
considera como tais aqueles descontos concedidos pelo fornecedor a seus
clientes ou distribuidores/varejistas, desde que suas compras ou vendas atinjam
ou excedam certos limiares formulados em termos de metas de volume,
porcentagens dos pedidos totais ou aumento das compras.
Nos casos de venda casada, o levantamento mostra que a maior
parte foi arquivada. A venda casada é prática comum, usada tanto por empresas
dominantes como não dominantes do mercado para oferecer produtos ou serviços
melhores, mais baratos e mais convenientes. Caio Mário Pereira Neto esclarece
que quase 70% dos casos são arquivados em etapas preliminares, ou seja, “as
decisões nem chegaram a analisar se haveria efeitos líquidos anticompetitivos
nesses casos”.
Pesquisa poderá ser referência para guia do Cade
O seminário contou com a presença do presidente do Conselho Administrativo
de Defesa Econômica (Cade), Vinicius Marques de Carvalho, que disse que a
pesquisa do Cedes pode ser usada como referência no Guia que o Conselho deve
lançar no próximo ano.
“O Cade tem uma agenda de guias a ser implementada, que deve
ir para consulta pública no início do próximo ano. Vamos lançar o guia de
concentração horizontal, em seguida o de concentração vertical e, depois, o
guia de restrições verticais. O debate do Cedes é muito importante. Já que o
órgão da defesa da concorrência se autoimpôs a missão de elaborar guias, o
debate do Cedes, com um maior aprofundamento, pode trazer um produto muito
importante no momento em que o Cade for discutir esse guia”, disse o
presidente.
O presidente do CEDES, João Grandino Rodas, afirmou que a pesquisa
proporciona um passo importante para todo o trabalho que a entidade vem
desenvolvendo e que, em breve, o material será publicado no formato de livro
para acesso de todos.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 19 de dezembro de 2012.
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