Em 2013 entra em vigor o Foreign Account Tax Compliance Act
— FATCA, legislação norte-americana que tem como objetivo reduzir a evasão
fiscal nos Estados Unidos. Embora essa seja uma legislação estrangeira, as
regras do FATCA impactarão instituições financeiras e certas entidades não
financeiras em todo o mundo, inclusive no Brasil.
Conforme descrito na página da internet da Receita Federal
norte-americana (Internal Revenue Service — IRS), o FATCA vai exigir que
instituições financeiras que não sejam sediadas nos Estados Unidos transmitam
diretamente ao IRS certas informações sobre operações financeiras contratadas
com contribuintes norte-americanos ou com empresas estrangeiras que tenham
contribuintes norte-americanos entre os seus maiores acionistas.
De acordo com o disposto no site do IRS, para atender às
exigências do FATCA, as instituições financeiras estrangeiras afetadas terão
que firmar um contrato com a Receita Federal dos Estados Unidos até 30 de junho
de 2013, por meio do qual essas instituições terão que (i) identificar em sua
base de dados os clientes norte-americanos, (ii) transmitir anualmente ao IRS
informações sobre os seus clientes norte-americanos, e (iii) reter e enviar ao
IRS 30% do valor de todos os pagamentos cujos recursos sejam provenientes dos
Estados Unidos, feitos a uma instituição que não tenha firmado o referido
contrato com o IRS ou a clientes que não tenham fornecido informações
suficientes para a comprovação de sua nacionalidade, no caso de pessoas
físicas, ou da nacionalidade de seus acionistas, no caso de pessoas jurídicas.
Além do impacto operacional que será causado pelo FATCA, as
instituições brasileiras afetadas terão que enfrentar uma série de questões
jurídicas decorrentes das suas exigências. Uma delas é sobre sigilo bancário. A
lei de sigilo bancário brasileira (Lei Complementar 105/2001) exige o
consentimento por escrito do cliente para a divulgação de suas informações. Por
essa razão, as instituições financeiras brasileiras afetadas terão que obter
esse consentimento de todos os clientes de origem norte-americana. Além disso,
outra questão sobre o tema é o que essas instituições poderão fazer se o
cliente não concordar com tal divulgação. A conta-corrente do cliente, por
exemplo, poderá ser encerrada?
Outra questão jurídica relevante é a ausência de respaldo
legal no ordenamento jurídico brasileiro para a retenção de 30% dos valores a
serem pagos a instituições e clientes inadimplentes com o FATCA e a sua remessa
às autoridades norte-americanas. Além dessa retenção não se enquadrar na
definição de tributo do Código Tributário Nacional e, portanto, não ser
considerada legítima nem operacionalmente factível no Brasil, ainda não há no
Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais do Banco Central do
Brasil natureza para o enquadramento cambial da remessa desses recursos para o
exterior. Essas questões poderiam ser resolvidas por meio de um acordo
bilateral entre Brasil e Estados Unidos, a exemplo do que já aconteceu em
outros países.
Quando as questões em torno da natureza jurídica dos valores
a serem enviados às autoridades norte-americanas forem devidamente
esclarecidas, as instituições afetadas terão que analisar os eventuais impactos
fiscais sobre essas remessas e quem arcará com os seus respectivos custos.
Além disso, é recomendável que os novos contratos a serem
firmados entre as instituições brasileiras afetadas e os seus clientes possuam
cláusulas que tratem de algumas das exigências do FATCA. Essas cláusulas
deverão, por exemplo, autorizar a instituição a fazer as retenções que venham a
ser exigidas pelo FATCA, enviar os recursos para o IRS e a transmitir dados dos
clientes para as autoridades norte-americanas competentes. No entanto, não
temos como saber neste momento como essas cláusulas e exigências serão
interpretadas pelo Poder Judiciário brasileiro, quando as regras do FATCA
entrarem em vigor e afetarem clientes e instituições financeiras no País.
Por fim, vale ressaltar que as regras do FATCA serão
implementadas em etapas a partir de 2013. Assim, a forma como cada instituição
lidará com essas exigências pode ser um diferencial na segurança jurídica de
seus contratos e no relacionamento com os seus clientes.
Rafael Capelão Carretero é advogado do Machado, Meyer,
Sendacz e Opice Advogados, especialista em direito bancário e mercado
financeiro, mestre em direito (LLM) pela The University of Chicago Law School
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 14 de abril de 2013.
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