O julgamento do Supremo Tribunal Federal que afastou a
possibilidade de inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins em
operações de importação, no dia 20 de março, trouxe esperança para advogados
tributaristas que torcem pelo impacto positivo também na Ação Declaratória de
Constitucionalidade 18, que trata da inclusão do mesmo imposto na base do PIS e
da Cofins em geral. A disputa envolve R$ 89 bilhões que a Receita Federal terá
de devolver aos contribuintes caso saia derrotada, além do impacto de R$ 12
bilhões anuais a menos na arrecadação, segundo estimativas da Advocacia-Geral
da União.
Para tributaristas, um dos argumentos usados pela Fazenda
Nacional na defesa da manutenção do ICMS sobre a base das contribuições
incidentes sobre importações pode ser, agora, útil às empresas. Durante o
julgamento, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional alegou que a não inclusão
violaria o princípio da isonomia em relação a produtos nacionais, não
beneficiados pela decisão. E é justamente para a isonomia alegada pelo fisco
que os contribuintes agora querem que os ministros do Supremo atentem,
permitindo a exclusão do imposto da base das contribuições tanto na importação
quanto no mercado interno. Do outro lado, porém, está o argumento de que
existem fundamentos diferentes para cada caso. O PIS e a Cofins internos
incidem sobre o faturamento das empresas. Já as contribuições sobre importações
se baseiam no valor aduaneiro.
A Ação Declaratória de Constitucionalidade 18, ajuizada pela
AGU em 2007, foi passada à frente, pelo STF, do Recurso Extraordinário 240.785,
que já acumulava seis votos favoráveis aos contribuintes sobre o assunto, e um
a favor do fisco. A estratégia da União foi zerar o placar ao entrar com uma
ação de controle concentrado, que tem prioridade sobre casos difusos, para
impedir uma derrota certa. A estratégia funcionou: os ministros Sepúlveda
Pertence, Cezar Peluso e Ayres Britto, que haviam votado contra o fisco, já se
aposentaram.
Impacto na ADC 18
Para Fernando Vaisman, tributarista do escritório Almeida
Advogados, há possibilidade de impacto da decisão do Supremo na ADC 18, embora
as teses sejam distintas. “No julgamento deste mês no STF, ao analisar o
argumento da isonomia trazido pela Fazenda Nacional, alguns ministros
manifestaram-se no sentido de que, se a isonomia for aplicável, o será para
excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins incidentes no mercado
interno”, diz.
No julgamento, a PGFN argumentou que não há conceito
constitucional de valor aduaneiro, que pode ser dado pela lei, e que a inclusão
do ICMS na base das contribuições sobre operações de importação respeita o
princípio da isonomia em relação à tributação no mercado interno. O ministro
Dias Toffoli, no entanto, apontou em seu voto que o princípio da isonomia não pode
justificar essa forma de tributação, ao deixar de atender às limitações
impostas pela Constituição.
"O Supremo não deu muito peso à argumentação do fisco
em torno da isonomia, o que pode apontar para um julgamento favorável também na
ADC 18", analisa o tributarista Igor Mauler Santiago, do escritório Sacha
Calmon Misabel Derzi Consultores e Advogados. "Vai haver a isonomia a que
a Fazenda se refere, mas não com a inclusão do ICMS nas duas situações, mas com
a exclusão do ICMS tanto na importação quanto no mercado interno.”
Opinião contrária tem o professor de Direito Tributário da
Universidade de São Paulo Luís Eduardo Schoueri, do Lacaz Martins, Pereira
Neto, Gurevich & Schoueri Advogados. Para ele, o julgamento do Supremo em
relação à importação não terá influência na decisão da ADC 18, uma vez que a
ação direta discute se o ICMS compõe ou não o faturamento das empresas. “Quando
eu vendo uma mercadoria, e essa mercadoria tem ICMS, esse tributo é receita
minha ou não? O contribuinte defende que apenas está coletando um dinheiro que
é do Estado. O fisco, porém, afirma que faz parte do faturamento”, explica.
Em seu voto no dia 20, o ministro Marco Aurélio mostrou
concordar com o argumento. "Já tive a oportunidade de dizer que o
contribuinte não fatura tributo. Quem o faz é o Estado", disse.
Já no caso da importação, o tema é diferente, afirma
Schoueri. Segundo ele, a Constituição, quando admitiu a cobrança da Cofins na
importação, afirmou que a base de cálculo é o valor aduaneiro — valor da
mercadoria na importação. “A Cofins incide sobre duas coisas: o faturamento e o
valor aduaneiro — no caso da importação. São dois fundamentos diferentes. O
Supremo disse que o valor aduaneiro é o valor no momento da importação, e o
ICMS não compõe esse valor. A outra questão é: o ICMS compõe o valor do meu
faturamento?”
O mesmo entende Ana Cláudia Utumi, tributarista do
TozziniFreire Advogados. “A base da decisão do Supremo foi dizer que a
Constituição, quando foi mudada para estabelecer que era possível fazer uma cobrança
de contribuições sociais sobre alguma coisa, essa coisa seria a importação. No
momento em que incluo o ICMS ou mesmo o PIS/Cofins na base de cálculo, estaria
excedendo ao valor aduaneiro. Por isso, a base da decisão não é a mesma que
está em discussão na ADC 18.”
Importações livres
Na decisão que julgou inconstitucional a inclusão do ICMS
sobre a base das contribuições sobre importações, os ministros analisaram o
Recurso Extraordinário 559.937 da União contra decisão do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região que, em 2007, já havia decidido pela impossibilidade da
cobrança.
O ministro Dias Toffoli acompanhou o entendimento da
ministra Ellen Gracie (aposentada), relatora, ao negar o recurso da União. Ele
apontou que a regra em questionamento extrapola o artigo 149 da Constituição,
ao determinar que as contribuições fossem calculadas não só sobre o valor
aduaneiro, mas ainda sobre o valor do ICMS e sobre o valor do PIS e da Cofins.
O voto do ministro foi acompanhado de forma unânime. Com a aposentadoria da
ministra Ellen Gracie, relatora original, Dias Toffoli redigirá o acórdão.
A cobrança é prevista pela Lei 10.865/2004 e, segundo
cálculo do próprio governo federal, sua discussão envolve R$ 33,8 bilhões em
ações que tramitam em outros tribunais.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional deverá entrar com
Embargos de Declaração para que os efeitos da decisão sejam modulados apenas a
partir de agora e a União não corra o risco de ter de restituir os valores já
recolhidos.
Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 1º de abril de 2013.
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