Segue interessante artigo do Ilustre Kiyoshi Harada sobre ser o não devido o ITBI nos casos de imóveis expropriados e devolvidos ao proprietário, procedimento chamado de RETROCESSÃO.
ITBI E RETOCESSÃO
Kiyoshi Harada
Incide ou não do imposto sobre a transmissão inter vivos
de bens imóveis e de direitos a ele relativos na retrocessão?
Matéria não inteiramente pacificada na doutrina diz
respeito à incidência ou não do imposto sobre a transmissão inter vivos de bens
imóveis e de direitos a ele relativos na retrocessão.
O fato gerador desse imposto é a transmissão de bens
imóveis ou de direitos a ele relativos. E a transmissão de bens imóveis nos
expressos termos do art. 1.245 do Código Civil opera-se mediante o registro do
título de transferência no Registro de Imóveis. Esse conceito é vinculante
dentro do Direito Tributário em face do disposto no art. 110 do CTN, pois o
termo “transmissão” foi empregado no texto constitucional para definir a
competência impositiva municipal (art. 156, II da CF).
Basta, pois, verificar se na retrocessão há ou não
transmissão de propriedade imobiliária.
Consoante escrevemos:
“Os bens desapropriados, como não poderia deixar de ser,
vinculam-se ao interesse público específico invocado pelo expropriante sob pena
de devolução ao antigo proprietário. O desvio na destinação do imóvel
desapropriado enseja a retrocessão, que outra coisa não é senão a
reincorporação do bem expropriado ao patrimônio do ex-proprietário, mediante
devolução da indenização recebida, por inexistir o vínculo entre o sacrifício
suportado pelo particular e o interesse público invocado como razão de
desapropriar.” [1]
A destinação do imóvel desapropriado para um determinado
fim público para outro igualmente caracterizador do interesse público não dá
ensejo à retrocessão.[2]
A retrocessão tem fundamento no art. 519 do CC que assim
prescreve:
“Art. 519. Se a coisa expropriada para fins de
necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, não tiver o destino
para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou serviços públicos,
caberá ao expropriado direito de preferência, pelo preço atual da coisa.”
Indiscutível a incidência do ITBI na retrocessão, pois há
ocorrência de fato gerador da obrigação tributária que é a transmissão da
propriedade pelo poder público expropriante. A reincorporação do imóvel ao
patrimônio do ex proprietário implica ato de transmissão da propriedade.
Nesse sentido a Súmula 111 do STF:
Súmula 111. “É legítima a incidência do importo de
transmissão inter vivos sobre a restituição, ao antigo proprietário, de imóvel
que deixou de servir à finalidade da sua desapropriação.”
A retrocessão não se confunde com a preempção, figura de
direito privado resultante de convenção das partes e não de lei, conforme
dispõe o art. 513 do CC:
“Art. 513. A preempção, ou preferência, impõe ao
comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa que aquele vai vender, ou
dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na compra, tanto
por tanto.”
Exercido o direito de preferência há incidência do ITBI
no registro do título respectivo.
Só que a incidência do ITBI em caso de retrocessão
dependerá do que dispuser a lei de cada Município. É que o art. 42 do CTN
dispõe que o “contribuinte do imposto é qualquer das partes na operação, conforme
dispuser a lei.”
No Município de São Paulo, o contribuinte do ITBI é o
comprador nas operações de compra e venda, mas é o cedente no caso de cessão de
direitos imobiliários. Enfim, cada Município é livre para eleger o contribuinte
nessas duas hipóteses.
Caso a lei municipal tenha eleito o vendedor nas
operações de compra e venda como sendo o contribuinte, na hipótese de
retrocessão não haverá incidência do ITBI por força da imunidade recíproca
das entidades políticas (art. 150, VI, a da CF). A imunidade
do transmitente, no caso, não poderá deslocar a responsabilidade pelo
pagamento do imposto ao comprador, pois não tem aplicação o disposto na parte
final do § 3º, do art. 150 da CF do seguinte teor:
“As vedações do inciso VI, a, e do parágrafo anterior não
se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços relacionados com exploração de
atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos
privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo
usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto
relativamente ao bem imóvel.”
Com se vê, a parte final do dispositivo retrotranscrito
refere-se à incidência do IPTU na hipótese de imunidade do proprietário, pois o
compromissário comprador é contribuinte desse imposto nos termos do art.34 do
CTN. Não tem qualquer implicação com o ITBI. Aliás, no caso de retrocessão de
que estamos tratando descabe a cogitação de promitente comprador de que trata o
dispositivo constitucional do § 3º, do art. 150.
Concluindo, se a lei local tiver eleito como contribuinte
do ITBI o vendedor, e não o comprador, na hipótese de retrocessão não haverá
incidência desse imposto.
Notas
[1] Cf. nosso Desapropriação doutrina e prática, 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, p.212.
[2] RTJ 48/749; RTJ 53/45; RTJ 59/631; RF 206/89; RT
470/264; RTJ 73/654; RTJ 98/373.
Autor: Kiyoshi Harada
Sócio fundador da Harada Advogados Associados.
Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP.
Professor de Direito Financeiro, Tributário e Administrativo. Presidente do
Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos - CEPEJUR. Conselheiro do Instituto dos
Advogados de São Paulo e ex-Diretor da Escola Paulista de Advocacia.
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