A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
definiu entendimento sobre tema repetidamente submetido aos tribunais: o
consumidor possui legitimidade para contestar a cobrança de Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no caso de energia elétrica que,
apesar de contratada, não foi efetivamente fornecida.
O julgamento se deu no rito dos recursos repetitivos,
previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil, e vai orientar os
tribunais de segunda instância no tratamento dos recursos que abordam o mesmo
tema e que estavam sobrestados à espera da decisão do STJ.
Os ministros rejeitaram o argumento do fisco de que o
destinatário final da energia não integra a relação tributária, já que não arca
diretamente com os custos do imposto. Para o ministro Cesar Asfor Rocha, esse entendimento
é perverso quando aplicado aos serviços de concessionárias públicas.
Mesmo lado
Conforme o ministro Cesar Rocha, a concessionária e o
estado atuam em conjunto, com a concessionária em situação de quase total
submissão, sob pena de rescisão da concessão caso desrespeite as diretrizes e
políticas do estado. “Politicamente, portanto, nas relações contratuais em
geral estabelecidas com o poder público, a concessionária sempre evitará
embates desgastantes e que gerem prejuízos aos serviços ou aos interesses
públicos”, afirmou.
“Mas não é só. Sem dúvida alguma, sobretudo no tocante à
cobrança, ao cálculo e à majoração dos tributos – à exceção do Imposto de Renda
–, o poder concedente e a concessionária encontram-se, na verdade, lado a lado,
ausente qualquer possibilidade de conflitos de interesses”, completou Cesar
Rocha.
O ministro explicou que, nas hipóteses de mudança nos
tributos, a lei protege a concessionária, obrigando a revisão dos valores de
tarifas a fim de preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato. “Sob esse
enfoque é que o estado-concedente e a concessionária do serviço público
encontram-se lado a lado, no mesmo polo, em situação absolutamente cômoda e sem
desavenças, inviabilizando qualquer litígio em casos como o presente”, anotou.
Desprotegido
“O consumidor da energia elétrica, por sua vez, observada
a mencionada relação paradisíaca concedente/concessionária, fica relegado e
totalmente prejudicado e desprotegido. Esse quadro revela que a concessionária
assume o papel de contribuinte de direito apenas formalmente, assim como o
consumidor também assume a posição de contribuinte de fato em caráter meramente
formal”, ponderou o relator.
Conforme o ministro, o usuário de energia elétrica não
teria outra opção: “Ou paga a tarifa com o ICMS eventualmente ilegal ou ficará
sem o serviço, o que implica desligar lâmpadas, geladeiras, televisores,
equipamentos indispensáveis à saúde de enfermos, equipamentos industriais etc.,
ou lança mão de outras fontes de energia, excessivamente caras e não
produtivas.”
Para o ministro Cesar Rocha, impedir que o consumidor
final conteste essa cobrança – que o próprio STJ considera ilegal –
significaria impedir qualquer discussão judicial sobre casos desse tipo, já que
a concessionária não teria interesse em entrar nesse litígio contra o estado.
Ele destacou que, no direito tributário, o que vale é a verdadeira natureza das
coisas e das suas relações.
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