A complexidade dos negócios impõe que muitas empresas se
organizem através de estruturas formadas por diversas pessoas jurídicas. Em que
pese não seja propriamente novidade, em matéria tributária o tema da
responsabilidade de empresas integrantes de grupos econômicos vem ganhando cada
vez mais relevância, principalmente em virtude dos constantes pedidos de
redirecionamento de execuções fiscais realizados pelas procuradorias fiscais,
que vislumbram nesta responsabilização uma forma possível de satisfazer o crédito
tributário.
Ainda há muita indefinição sobre o assunto em função da
deficiência da legislação, o que traz muita insegurança para as empresas
realizarem novos negócios. O argumento mais comum para a fundamentação do
pleito de redirecionamento é o artigo 124, inciso I, do Código Tributário
Nacional (CTN), que exige o “interesse comum na situação que constitua o fato
gerador do tributo” e, para o caso das contribuições previdenciárias, o artigo
30, inciso IX da Lei 8.212/91, que impõe regra de solidariedade para as
empresas que participam do grupo econômico.
Em análise da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça, é possível verificar que a corte, de forma pacífica, entende que a
aplicação do artigo 124, inciso I, do CTN só pode ocorrer quando o interesse
comum na realização do fato gerador seja o interesse jurídico, que pressupõe a
prática conjunta do fato, o que afasta a responsabilidade pela simples
circunstância de uma sociedade pertencer ao mesmo grupo econômico de outra.
Por outro lado, é interessante notar que os casos analisados
pelo STJ, que levaram a formação deste entendimento, são bem antigos e não
enfrentam o redirecionamento aos grupos econômicos de fato envolvidos em
suspeita de fraude, simulações ou abuso de personalidade jurídica[1].
O que se verifica é que a análise destes casos mais
complexos que envolvem grupos econômicos de fato, por vezes envolvidos em
fraude, tem sido obstada pela aplicação cada vez mais alargada da Súmula 07,
que impede o STJ de averiguar matéria de fato em Recurso Especial. Assim,
independente da fundamentação das instâncias inferiores, a corte tem mantido as
decisões sem adentrar no mérito.
Pode-se observar em alguns obter dictum dos casos, que a
jurisprudência pode vir a ser superada nos casos de fraude, possibilitando-se a
aplicação do artigo 124, inciso I do CTN em combinação com o artigo 50 do
Código Civil, que permite a desconsideração da personalidade jurídica. Seguindo
este raciocínio, seria possível aventar a tese de que, unicamente nestas
hipóteses de fraude, poderia ser identificado o interesse comum entre as
empresas de um grupo, mesmo que não tenham realizado formalmente o fato
jurídico tributário. Dado o conluio ou a fraude, a realização conjunta do fato
gerador estaria presente, afinal o que se teria era uma única pessoa jurídica
englobando todas as demais. Necessário para isto, porém, que o fisco prove de
forma contundente os atos ilícitos praticados.
Em relação às contribuições previdenciárias, o STJ tem
aceito a aplicação do artigo 30, inciso IX da Lei 8.212/91, em conjunto com o
artigo 124, inciso II do CTN, de modo que a responsabilização do grupo
econômico tem sido mantida. O que se percebe é que o debate passou, até o
momento, ao largo dos argumentos
aventados por grande parte da doutrina que sustenta a inconstitucionalidade do
dispositivo, devido a quebra da reserva de lei complementar para tratar de
responsabilidade tributária.
Diante do cenário jurisprudencial, percebe-se que o STJ
ainda não enfrentou uma série de questões importantes sobre o tema da
responsabilidade tributária de grupos econômicos. Além da questão da fraude e
da constitucionalidade da responsabilização por contribuições previdenciárias,
a própria definição do que seriam os grupos econômicos para efeitos de
responsabilização em matéria tributária há de ser esclarecida.
Ante a incerteza do cenário, surge o novo CPC com a previsão
do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, aplicável também às
execuções fiscais. Com a utilização deste instrumento, pode-se assegurar que as
pessoas contra as quais se busca redirecionar os feitos executivos, poderão ao
menos exercer o contraditório antes de sofrer ônus de garantir a dívida. Apenas
isto, porém, não é suficiente para minimizar a ausência de previsibilidade que
envolve o tema.
Diante de todo o panorama demonstrado, verificamos que
algumas questões relativas à responsabilidade tributária de grupos econômicos
seguem em aberto e devem ser enfrentadas futuramente pelo STJ. Enquanto isso
não ocorre e enquanto a legislação não for aperfeiçoada, reina a insegurança
jurídica em matéria tão relevante a todos os envolvidos na relação jurídica de
natureza tributária.
[1] Como exemplo os REsp 859.616/RS, ERESP 834.044/RS ou
REsp 884.845/SC.
Leonardo Nuñez Campos é advogado, especialista em Direito
Tributário pelo IBET e aluno do mestrado profissional da FGV/Direito SP.
Juliana Furtado Costa Araujo é procuradora da Fazenda
Nacional, doutora em Direito Tributário pela PUC-SP e professora do mestrado
profissional da FGV/Direito SP.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 9 de junho de 2015, 7h11
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