“Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a
conhece”. Assim está estabelecido no artigo 3º da Lei de Introdução às normas
do Direito Brasileiro (Decreto-Lei 4.657/42, alterada pela Lei 12.376 de 30 de
dezembro de 2010), no entanto, como ter conhecimento de todas as obrigações se
somente em 2013, até o mês de julho, já foram aprovadas pela Câmara dos
Deputados duas novas Emendas Constitucionais, duas Leis Complementares e 64 Leis Ordinárias? O mais incrível é que tal
produção está somente em âmbito federal. Se trouxermos para o âmbito das leis
estaduais e municipais, a totalização será um número ainda mais atormentador.
A Lei 10.267, de 2001, mais conhecida como Lei do
Georreferenciamento, é uma dessas que, mesmo com 12 anos de existência, ainda é
desconhecida por grande parte dos proprietários rurais, causando transtorno aos
que nessa obrigação legal esbarram. A referida lei modificou a Lei 6.015, de
1973 (Lei dos Registros Públicos), sendo sua mudança mais significativa a
determinação de que o georreferenciamento do imóvel rural deve ser averbado em
sua matrícula junto ao Cartório de Registro de Imóveis.
O georreferenciamento do imóvel rural é um procedimento
técnico através do qual o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra) gerencia e promove o ordenamento da estrutura fundiária nacional,
mantendo atualizado um cadastro nacional de imóveis rurais, de proprietários e
detentores de imóveis rurais e de arrendatários e parceiros — obrigatório para
todos os imóveis rurais — consoante as determinações da Lei 10.267, de 2001, e
atualmente regulamentado pela Norma de Execução 105/2012 do Incra.
Para a realização do referido procedimento é preciso que o
interessado contrate um profissional da área de agrimensura credenciado junto
ao Incra e apresente documentação necessária para a posterior certificação do
imóvel, tais como requerimento, relatório técnico com a descrição do objeto,
período de execução, nome do proprietário, quantidade e descrição dos
equipamentos e softwares utilizados, quadro resumo das precisões obtidas, cópia
da matrícula, planta, memorial descritivo, planilha técnica, dentre outros.
Toda a documentação é analisada por servidores públicos; em caso de regularidade,
é expedida a respectiva certificação.
Sem a respectiva certificação, o imóvel rural não poderá ser
vendido, partilhado, permutado, doado, desmembrado, remembrado, alienado
fiduciariamente e nem poderá ser realizada a contratação de empréstimos agrícolas
(financiamentos) que permitam a execução da função social por parte do imóvel
rural, podendo redundar, no caso de descumprimento da função social da
propriedade, na desapropriação por interesse social para fins de reforma
agrária, com o recebimento como pagamento de Títulos da Dívida Agrária
resgatáveis do 2º ao 20º ano.
A finalidade maior e última do georreferenciamento é ultimar
as providências necessárias e cabíveis com o intuito de acabar definitivamente
com a sobreposição de imóveis mediante a utilização do sistema geodésico
brasileiro, concedendo assim uma maior segurança jurídica ao sistema fundiário
brasileiro.
Enfim, a despeito da boa intenção da norma jurídica, o Incra
não está aparelhado para dar resposta à demanda nacional de georreferenciamento
de todos os imóveis rurais, sendo motivo gerador de outros dois decretos-lei
que alteraram o prazo final de obrigatoriedade do averbamento do
georreferenciamento na escritura pública do imóvel rural.
O último Decreto-Lei 7.620, de 2011, estabelece os seguintes
prazos: noventa dias, para os imóveis com área de cinco mil hectares, ou
superior; um ano, para os imóveis com área de mil a menos de cinco mil
hectares; cinco anos, para os imóveis com área de quinhentos a menos de mil
hectares; dez anos, para os imóveis com área de duzentos e cinquenta a menos de
quinhentos hectares; treze anos, para os imóveis com área de cem a menos de
duzentos e cinquenta hectares; dezesseis anos, para os imóveis com área de
vinte e cinco a menos de cem hectares; vinte anos, para os imóveis com área
inferior a vinte e cinco hectares.
O Parágrafo 3º do artigo 10 do Decreto-Lei 4.449, de 2002,
fixa a data de 20 de novembro de 2003 como início de contagem para esses
prazos, ou seja, a partir de novembro de 2013 todos os imóveis com área de
duzentos e cinquenta hectares ou maiores são obrigados a proceder com o
georreferenciamento.
Assim, é importante frisar que todos os processos
administrativos de mesma natureza trazem como objeto a solicitação de
certificação dos serviços de georreferenciamento, gerando uma sobrecarga de
atividades para a autarquia fundiária. Isso compele o proprietário do imóvel
rural a precaver-se e a solicitar o quanto antes o georreferenciamento de seu
imóvel sob pena de sofrer elevados prejuízos quando necessitar realizar
quaisquer das operações já citadas (venda, partilha, permuta, doação,
desmembramento e remembramento, alienação fiduciária, empréstimos agrícolas,
etc.). Se empreender no Brasil já é um desafio naturalmente oneroso, o
indivíduo ser surpreendido com obrigações legais novas e antigas é uma situação
ainda mais desconfortável.
Por tudo o que foi exposto, tem-se que, de acordo com a lei,
os proprietários de imóveis rurais estão obrigados a georreferenciar
imediatamente seus imóveis, sendo prudente e recomendável que tal operação seja
realizada o quanto antes, até mesmo para evitar prejuízos, já que o Incra, não
conseguindo expedir a certificação em prazos razoáveis, vem atendendo
prioritariamente aos pedidos emergenciais solicitados através de medidas
extrajudiciais e judiciais cabíveis. Intenta-se, assim, acelerar de forma
legítima o processo de certificação dos imóveis rurais, evitando maiores
transtornos aos proprietários e detentores da posse.
Fábio Antônio Silva de Oliveira - advogado.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 21 de agosto de 2013
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