quarta-feira, 11 de novembro de 2020

STF- Fux dá o sétimo voto pela não incidência de ICMS sobre licença de uso de softwares

 O Supremo Tribunal Federal (STF) tem sete votos pela inconstitucionalidade da incidência do ICMS sobre programas de computador nas situações de licenciamento e cessão de uso, com a maioria definindo a incidência do Imposto Sobre Serviço (ISS). O caso voltou à pauta nesta quarta-feira (11/11), porém o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Nunes Marques, que afirmou ainda não ter tido a oportunidade de estudar o caso – ele disse só ter tido acesso aos sistemas do tribunal na última segunda-feira (9/11). 


No dia 4 de novembro seis ministros já haviam votado neste sentido, e nessa quarta o presidente Luiz Fux deu o sétimo voto. Assim, há maioria para declarar inconstitucionais normas do Mato Grosso e de Minas Gerais, bem como uma norma federal que fixam a incidência do ICMS sobre estes programas. 

Apesar disso, não há maioria para modulação dos efeitos da decisão. Cinco ministros já adiantaram seu entendimento para modular, o que faria com que a declaração de inconstitucionalidade só produzisse efeitos após a publicação da ata de julgamento. Fux, nesta quarta, não tratou sobre este ponto. 

 

Duas ações

O tema é debatido em duas ações, uma de relatoria da ministra Cármen Lúcia, e outra de relatoria de Dias Toffoli. Os dois votaram de forma divergente, e saiu vencedora até agora a linha de entendimento do ministro Dias Toffoli. 

A primeira foi a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1945, ajuizada pelo MDB para contestar a constitucionalidade da Lei 7.098/1998, do estado do Mato Grosso. A relatora é a ministra Cármen Lúcia. 

Já a segunda, mais recente, é a ADI 5659, ajuizada pela Confederação Nacional de Serviços (CNS). A entidade ataca o Decreto 46.877/2015 e a Lei 6.763/1975, de Minas Gerais. A ação também pede a inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei Complementar Federal 87/1996. As normas fixam a incidência do ICMS sobre softwares. A CNS alega que há bitributação, pois uma lei federal de 2003 prevê a tributação destes programas pelo ISS. O relator é o ministro Dias Toffoli.

A ADI 1945 começou a ser julgada no plenário virtual em abril deste ano, ocasião em que a ministra Cármen Lúcia votou pela prejudicialidade parcial da ação, já que uma parte da norma questionada foi revogada, e pela improcedência no que foi mantido, mantendo a lei mato grossense que tributa os softwares com o ICMS. Na ocasião, foi acompanhada pelo ministro Edson Fachin. 

O ministro Dias Toffoli pediu vista, e o processo passou a ser julgado em conjunto com a ADI 5659. Toffoli divergiu de Cármen Lúcia, declarando inconstitucional a lei de Mato Grosso e também as normas mineiras, bem como o parte da LC 87/1996. 

Para Toffoli, quando uma pessoa ou empresa compra um software, e este programa é constantemente atualizado, tem serviços de manutenção e de ajuda ao usuário, não é mais uma mercadoria, e sim um serviço, não importando se é um software personalizado ou padronizado (de prateleira). 

Toffoli foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Foi acompanhado em parte pelo ministro Marco Aurélio Mello, que não tratou da modulação de efeitos. Fux, nesta quarta, também acompanhou Toffoli, mas não falou sobre a questão da modulação, que deve ser discutida ao fim do julgamento. 

Já o entendimento da ministra Cármen Lúcia foi no sentido de que o licenciamento e cessão de uso não envolve um serviço, e sim uma mercadoria. A magistrada admitiu que esse é um tema em evolução constante, e que seu entendimento poderá mudar no futuro. Mas, no momento, ainda considera que se trata de uma mercadoria, ainda que haja licença ou cessão de uso para os usuários. Esse entendimento foi seguido por Edson Fachin e, em parte, pelo ministro Gilmar Mendes. 

 


Votos

No dia 4, Toffoli, que inaugurou a corrente majoritária, argumentou que os softwares, na situação de licenciamento ou cessão de uso, são uma transferência de um bem digital, e se caracterizam pela prestação constante de serviços ao usuário, seja um software padronizado, seja personalizado. Para Toffoli, “há uma operação mista ou complexa, envolvendo, além da obrigação de dar um bem digital, uma obrigação de fazer. A obrigação de fazer está presente naquele esforço intelectual e, ainda, nos demais serviços prestados ao usuário, como o Help Desk, a disponibilização de manuais, atualizações tecnológicas e outras funcionalidades previstas no contrato de licenciamento”, afirmou. 

Um dos exemplos utilizados por Toffoli foi o Microsoft 365, que se dá por assinatura e inclui os recursos conectados à nuvem mais colaborativos e atualizados, em uma experiência integrada e contínua. “Nesse caso, o assinante terá os recursos, correções e atualizações de segurança mais recentes, além de suporte técnico contínuo, sem nenhum custo extra. Assim, ainda que se admita ser legítima a incidência do ICMS sobre bens incorpóreos ou imateriais, como admito, é indispensável para que ocorra o fato gerador do imposto estadual que haja transferência de propriedade do bem, o que não parece ocorrer nas operações com software que estejam embasadas em licenças ou cessões do direito de uso”, disse. 

Já a compra do Pacote Office de forma única, como era realizada antigamente, sem direito a atualizações e outros recursos, seria passível de tributação pelo ICMS, por ser apenas a compra de uma mercadoria. Em relação aos serviços de computação em nuvem, também incidiria o ISS e não o ICMS, por haver o fornecimento de serviços como servidores, armazenamento, rede, banco de dados, análise  e inteligência ao usuário. 

O ministro destacou que seu entendimento sobre a impossibilidade da tributação pelo ICMS se restringe ao fornecimento de programas de computador mediante contrato de licenciamento ou cessão de direito de uso, como previsto no subitem 1.05 do Anexo à Lei Complementar 116/03. Mas, “dada a complexidade inerente aos conceitos de tecnologia da informação, há complicadores que afetam o direito tributário, na medida em que as relações jurídicas podem conter, ao longo de sua cadeia, mais de uma modalidade de serviço de computação”, falou Toffoli. 

Toffoli lembrou que está pendente de julgamento no Supremo a ADI 5958, que discute a validade do Convênio Confaz 106/2017, que tentou validar a cobrança do ICMS sobre todas as operações realizadas com software. O ministro afirmou que, quando este caso for julgado, o STF “terá nova oportunidade de revisitar tema tão complexo em todas as suas nuances”.  

O ministro Alexandre de Moraes acompanhou o entendimento defendido por Toffoli. Para ele, os softwares têm característica dinâmica. Ainda que se entenda que se trata de uma operação complexa, para ele há a prevalência da característica dos serviços na matéria. “A questão não se resume à venda de mercadoria. É uma prestação contínua de serviços, como armazenamento em nuvens, atualizações, segurança via antivírus. É um pacote de serviços. Quando se adquire um software, o que se está a adquirir é um pacote de serviços. Sendo assim, nos termos da Constituição Federal e da legislação, não me parece que possa incidir o ICMS”, disse.

Moraes exemplificou a posição ao diferenciar o contexto em que se dá a venda de softwares de produção e venda de geladeiras. “Há [no primeiro caso] uma cessão de direito de uso que vem junto com um pacote de serviços. Consequentemente me parece que deve ser privilegiado o posicionamento do legislador e incidir o imposto municipal, o ISS e não o ICMS”.

Na mesma linha, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que o STF tem entendido que, na hipótese de disponibilização online, sem cessão definitiva do programa de computador, o usuário remunera o detentor da licença mediante pagamentos periódicos em regime de assinatura pelo tempo de utilização do produto. "Portanto, não há aqui uma transferência da titularidade do bem. O programa nesse caso não é vendido e, portanto, penso que não é possível falar tecnicamente em circulação de mercadoria e consequentemente não é possível falar de incidência de ICMS”, disse. 

O ministro Edson Fachin, ao abrir a divergência na ADI 5659 – ele já havia votado com a relatora na outra ação – entendeu que softwares de prateleira são mercadorias, e não serviços. “O entendimento deste tribunal vem sendo no sentido de que, a fim de determinar qual imposto deve incidir, cumpre definir qual a atividade preponderante no caso concreto. Neste contexto, programas de computador só não são considerados mercadoria quando se contrata o serviço para desenvolvê-lo”, falou. 

Entretanto, disse que em caso de produto específico e personalizado, “a qualidade do serviço que envolve atividade, pesquisa, conhecimento e esforço se mostra nuclear, de extrema importância”, e neste caso incide o ISS. “Quando a criação intelectual é produzida em série, em massa, para ser comercializada, por outro lado, a destinação e objetivo da operação passam a ser a circulação, a venda e o lucro, e aí incide, eu meu modo de ver, o ICMS”, afirmou Fachin. 

Cármen Lúcia, ao acompanhar Fachin, disse que é uma matéria “que daqui a cinco anos já terá outras grandes novidades e vai demandar novos conceitos jurídicos e novas definições legais, para saber o que é mercancia”, mas que no momento ainda considera ser mercadoria. 

“A alteração deste código computacional programado de maneira genérica, voltado a um livre mercado de usuários, com resultados úteis ao licenciado ou cessionário, ainda conhecido como adquirente do produto, não faz o programa de computador equivaler a uma prestação de serviços. Para mim, as operações mercantis que façam circular licenças ou cessões de uso como softwares ou aplicativos, permitem a incidência do ICMS”, falou Cármen Lúcia. 

Gilmar Mendes votou da mesma maneira, pela incidência do ICMS em regra geral, mas ressalvando que sobre os softwares produzidos de forma personalizadas deve incidir o ISS.


FONTE: JOTA

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